sábado, 22 de junho de 2013

Resenha sobre o livro "Espetáculo das Raças: Cientistas, Instituições e Questão Racial no Brasil 1870-1930"


por  Sandreana  Melo*
            Em o Espetáculo das raças Lilia Schwarcz tem como objetivo entender a relevância e as transformações da teoria racial no Brasil entre os anos de 1870 e 1930. A autora enfatiza tanto a dinâmica de reconstrução de conceitos e modelos, como os contextos em que essas teorias se inserem no Brasil.  Dessa forma, o que importa para Schwarcz é a compreensão de “como o argumento racial foi política e historicamente construído, assim como o conceito “raça” que além de sua definição biológica acabou recebendo uma interpretação, sobretudo social.” (p. 17)
            Para Schwarcz, entender as vigências e absorção das teorias raciais no país se faz necessário para refletirmos sobre a originalidade do pensamento racial brasileiro no esforço de adaptação “ao modelo de sucesso Europeu” dos oitocentos, no que diz respeito ao ideal civilizatório. Apesar de chegar tarde ao Brasil, as teorias raciais são acolhidas com entusiasmo pela reduzida elite pensante nacional dos diversos estabelecimentos de ensino e pesquisa da época.
            Os denominados “homens de ciência” foram incumbidos da missão de refletir sobre a nação Brasileira, seu futuro e seus impasses, definidos como intelectuais que lutavam “pelo progresso scientífico do país” (p. 37). Eram eles: Manoel de Oliveira Lima, do IAGP, Francisco José de Oliveira Viana, do IHGN, Tobias Barreto, da Faculdade de Direitos de Recife, Silvio Romero, da Faculdade de Direito de Recife, João Bapistista Lacerda, do Museu Nacional, Raimundo Nina Rodrigues, da Faculdade de Medicina da Bahia, Euclides da Cunha, do IHGB, Edgard Roquete Pinto, do Museu Nacional, Herman Von lhering, do Museu Paulista, Oswaldo Cruz, da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, Miguel Pereira, da Academia de Medicina do Brasil, A. A. de Azevedo Sodré, da Faculdade de Medicina do Rio do Janeiro.   
            As teorias raciais europeias como o evolucionismo, o positivismo, o naturalismo, o social darwinismo, começam a difundir-se a partir dos anos de 1870. Estas teorias passaram por adaptações, sendo atualizadas de acordo com o contexto político e social brasileiro, ou seja, os intelectuais da época aproveitavam o que imaginavam combinar com o país e descartaram o que, de acordo com Schwarcz, era problemático para a construção de uma argumentação racial sobre a nação.
            As teorias raciais de então, se transformam em um argumento de sucesso para o estabelecimento de critérios diferenciadores de cidadania, bem como meio de pensar um projeto civilizatório para o país, além de legitimaram as diferenças sociais da antiga ordem escravocrata.
            Conforme Schwarcz, os “homens de Sciencia”, também chamados como “Novos ricos da cultura” por Antonio Candido (1988, p. 30), tenderam a adotar os modelos evolucionistas e em especial o social-darwinista, já bastantes desacreditados no contexto europeu da época. Esses grupos de intelectuais passaram a fazer do ecletismo e da leitura e interpretação de textos e manuais positivistas e darwinistas sua atividade intelectual por excelência.
O que é observado pela autora não é tradução aparentemente aleatória de pensadores estrangeiros, mas o trabalho de seleção realizado por eles sobre as teorias estrangeiras. As teorias adotadas no Brasil não foram “fruto da sorte”, mas, introduzidas de forma crítica e seletiva, como instrumento de respaldo conservador e autoritário sobre as hierarquias sociais já fortemente constituídas no país. (Ventura, 1988, p. 7, apud Schwarcz, p..42).
Enfim, as construções teóricas dos “homens de sciencia”, tiveram como principio representar uma solução original aos problemas e ao destino do Brasil. Os modelos teóricos adotados por esses “novos ricos da cultura”, simbolizavam “uma nova forma secular, materialista e moderna – de compreensão do mundo” (p.41). E um dos pontos importantes da reflexão da autora, é que a implementação desses modelos no país seria uma aproximação imaginária com o mundo europeu sinônimo de “progresso e de civilidade” para as elites políticas e intelectuais brasileiras. Ao mesmo, tempo que apesar do descrédito dessas teorias, no Brasil elas serviriam como justificativas teóricas para a “manutenção das práticas imperialistas de dominação” (p.30), e legitimação das consequentes diferenças sociais e econômicas do país.

Schwarcz, Lilia Moritz, Espetáculos das Raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.

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